Karapotós: FPI promove escuta, recebe reclamações nas áreas de saúde e educação e adotará medidas para transformar realidade vulnerável

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Quem primeiro falou em nome da comunidade tradicional foi a cacique Rosicleide dos Santos, a Nena, como é mais conhecida naquele território. Tendo herdado o cacicado – liderança da aldeia – do pai, ela detalhou quais são as principais dificuldades encontradas no dia a dia dos Karapotós. A primeira delas fez referência à má qualidade da água. “Não temos saneamento básico e nem água tratada. A água que hoje nós consumimos não é pura. Cada indígena se vira individualmente, cavando a sua própria cacimba. Então, o que nos resta é beber dessa água salobra e rezar para que ela não venha contaminada. É a mesma água para matar a sede, para fazer o café, para tomar banho e por aí em diante”, contou.

“Se a FPI puder intervir junto à Prefeitura de São Sebastião e à Funai (Fundação Nacional do Índio), será uma espécie de salvação pra gente. Estamos cansados de beber água com a sensação de que vamos contrair uma doença”, acrescentou.

Ausência de escola

Nena também reclamou da falta de uma unidade de ensino para levar educação para alunos dos ensinos infantil, fundamental e médio. Segundo ela, até foi construída uma escola, porém, ainda sem funcionamento. “Hoje nós temos mais de 130 crianças que não estão ainda na escola indígena, e esse é um direito nosso assegurado por lei. Carecemos da escola indígena aqui no território para que o nosso povo não seja afastado das suas tradições. A educação precisa vir junto com o respeito a história dos Karapotós, precisa estar lado a lado com os saberes tradicionais que nos formaram”, argumentou a liderança.

Durante sua explanação, a cacique pediu para que a FPI interceda para a construção de mais duas salas de aula – atualmente a unidade de ensino possui três -, e para que haja a contratação dos professores, de modo que o ano letivo de 2025 possa acontecer seguindo o calendário normal de atividades das escolas já existentes na região. “A escola indígena valoriza a diversidade étnica e as culturas dos povos indígenas, por isso, temos que ter professores com a devida formação. E eles existem, só ainda não chegaram para os Karapotós”, lamentou.

Sem demarcação

Apesar de já existir decreto do Governo Federal datado de 1992 classificando como reserva a área onde vivem os Karapotós, o território ainda não está sequer demarcado, foi o que informou o pajé Ercílio Batista Santos, líder religioso do grupo. “Temos mais de 300 famílias indígenas vivendo em um distrito junto aos não indígenas, e não é isso que nós queremos. Desejamos um espaço dotado de tudo aquilo que possa dar dignidade aos Karapotós. A ancestralidade dos nossos povos remonta ao século XVIII, mas, mesmo tendo se passado três séculos, continuamos buscando a mesma coisa. Até quando será assim? Até quando teremos que ver os indígenas saindo do seu território porque, nele, não há condições básicas de sobrevivência? São filhos deixando os pais e famílias se separando, e isso muito nos entristece”, disse ele.

“Vale ressaltar também que, como a área adquirida pela Funai, 20 anos atrás, é bem pequena, isso acabou gerando conflitos internos entre a própria comunidade, o que causa, de certa forma, uma desunião dos Karapotós”, lamentou o pajé.

Desmatamento

Ainda de acordo com ele, a ausência de demarcação e, por consequência, da homologação das terras, também favorece a ocupação de posseiros e o desmatamento. “Numa verificação rápida podemos constatar que onde os indígenas residem há a preservação das matas. Porém, no entorno, onde estão as propriedades particulares, é flagrante o desmatamento. O crime ambiental é praticado principalmente para plantar pasto para o gado”, relatou, complementando que a comunidade gostaria de receber uma das ações de soltura para colaborar com o processo de preservação à natureza.

Os Karapotós Terra Nova vivem no município de São Sebastião, no Baixo São Francisco. Os biomas existentes na região são a Caatinga e a Mata Atlântica.

O compromisso da FPI

Diante das demandas apresentadas, a FPI do Rio São Francisco vai elaborar um relatório para, a partir dele, acionar os órgãos competentes. “A gente constatou que a comunidade vive numa situação de vulnerabilidade social que necessita de intervenções urgentes. Com base no documento que vamos confeccionar, adotaremos todas as medidas necessárias para tentar reverter essa situação”, informou Ivan Soares, antropólogo e coordenador da equipe de Comunidades Tradicionais e Patrimônio Cultural.

Érico Gomes, procurador da República e coordenador da FPI, garantiu que, em breve, serão acionados órgãos como a Funai, além da própria Prefeitura de São Sebastião. “Vamos iniciar o quanto antes essas tratativas para que possamos interferir nessa realidade, transformando-a positivamente por meio de ações que proporcionem vida digna e cidadania aos Karapotós”, assegurou o membro do Ministério Público Federal.

A FPI do Rio São Francisco

A FPI tem o objetivo de melhorar a qualidade ambiental da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco e a qualidade de vida dos seus povos. Os trabalhos acontecem de modo contínuo e permanente. Para isso, realizam-se o diagnóstico dos danos ambientais e a adoção de providências administrativas, cíveis e criminais com a indução de políticas públicas.

Como programa, a FPI é estruturada em três fases: planejamento, campo e desdobramentos. A fase de desdobramento compreende o acompanhamento e monitoramento dos diagnósticos realizados e a atuação de repercussões de medidas administrativas pelos órgãos envolvidos, cíveis e/ou criminais e pelo Ministério Público competente.

Também é na fase de desdobramentos que o poder público e a sociedade civil organizada contribuem na regularização dos empreendimentos, reparação de danos detectados e efetivação das medidas de proteção necessárias.

Participam da 14ª etapa da Fiscalização Preventiva Integrada a Agência de Defesa e Inspeção Agropecuária de Alagoas (Adeal), Batalhão de Polícia Ambiental da Polícia Militar do Estado de Alagoas (BPA/PMAL), Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio Francisco (CBHSF), Conselho Regional de Engenharia e Agronomia de Alagoas (Crea/AL), Conselho Regional de Medicina Veterinária de Alagoas (CRMV/AL), Conselho Regional dos Técnicos Industriais da 3ª Região (CRT-3)Instituto Hori, Instituto do Meio Ambiente de Alagoas (IMA/AL)Instituto Para Preservação da Mata Atlântica (IPMA)Marinha do BrasilMinistério Público do Estado de Alagoas (MPE)Ministério Público Federal em Alagoas (MPF)Ministério Público do Trabalho em Alagoas (MPT)Polícia Federal (PF), Polícia Rodoviária Federal (PRF), Rede Mulheres de Comunidades Tradicionais (RMCT)Secretaria de Estado do Meio Ambiente e Recursos Hídricos (SEMARH)Secretaria de Estado da Mulher e dos Direitos Humanos (SEMUDH)Secretaria de Estado da Saúde (Sesau)SOS CaatingaTribunal de Contas do Estado de Alagoas (TCE/AL), Tribunal Regional Eleitoral de Alagoas (TRE/AL) e Universidade Estadual de Alagoas (Uneal).

A FPI do Rio São Francisco em Alagoas é coordenada pelo CBHSF, MPAL, MPF e BPA/PMAL, que desenvolvem os trabalhos de inteligência, organização e divulgação das atividades e resultados para a população.

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