FPI identifica grandes áreas desmatadas no território quilombola e ausência de água encanada, a menos de 8km da Prefeitura Municipal
Em visita da Fiscalização Preventiva Integrada (FPI) do Rio São Francisco, revelou-se a realidade da comunidade de remanescentes do Quilombo Carrasco, situada em Arapiraca, a cerca de 8 km da Prefeitura Municipal. A população enfrenta há anos a falta de água, a contaminação da água dos poços artesianos e a degradação de seu território devido a grandes desmatamentos e extração irregular de recursos naturais, como barro e piçarra.
A visita, realizada pela equipe de Comunidades Tradicionais, coordenada pelo Ministério Público Federal (MPF), contou também com técnicos da Fundação Cultural Palmares (FCP), da Secretaria do Estado do Meio Ambiente e Recursos Hídricos de Alagoas (Semarh), a Secretaria de Estado da Mulher e dos Direitos Humanos (Semudh, do Instituto do Meio Ambiente (IMA), do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), além dos Ministérios Públicos do Estado de Alagoas (MPAL). Também esteve presente o Promotor de Justiça do Ministério Público Estadual de Minas Gerais (MPMG) e coordenador do Centro de Apoio Operacional às Promotorias de Justiça de Apoio Comunitário, Inclusão e Mobilização Socais (CIMOS), Paulo César Vicente de Lima.
Com uma população de 315 famílias, apenas 10% delas têm acesso à água encanada em suas residências. Apesar da maioria das casas possuir encanamento e de a Casal já ter realizado até solenidade de comemoração pelo abastecimento de água na comunidade, a água nunca chegou efetivamente aos moradores.
Já a água acumulada nos poucos poços artesianos na comunidade apresenta altos níveis de nitrato, tornando-a imprópria para consumo humano, servindo apenas para a agricultura familiar. Além disso, o sistema de saneamento é precário, com fossas e sumidouros, “o que pode ser a causa da contaminação da água”, explicou o técnico da Semarh.
A falta d’água atinge também a infraestrutura pública, onde a falta de água afeta diretamente a escola local e a Unidade Básica de Saúde (UBS), evidenciando o impacto direto da escassez hídrica na qualidade de vida. Ambos os equipamentos públicos são abastecidos por caminhões-pipa. A representante do IMA na equipe constatou que uma das cisternas da escola já não tinha água e outra estava com menos da metade de sua capacidade.
Para suprir carência de água nas casas, os moradores são obrigados a recorrer a alternativas custosas, desembolsando cerca de 350 reais a cada dois ou três meses para garantir água para consumo. Essa realidade destaca a vulnerabilidade socioeconômica enfrentada pela comunidade, onde muitos dependem da agricultura de subsistência, do Programa Bolsa Família e de atividades de faxina para sobreviver, ou deixam suas famílias por trabalhos – muitas vezes – degradantes em fazendas de outros estados do país.
Quintais produtivos agroecológicos
Apesar dos desafios, iniciativas fomentadas pela Coordenação Feminina Quilombolas de Alagoas – Dandara, como os quintais produtivos, têm sido implementadas, permitindo que as famílias cultivem alimentos como feijão, milho, mandioca e macaxeira, visando à segurança alimentar e à geração de renda. A Coordenação Dandara busca promover a união entre as comunidades, buscando melhorias coletivas e sustentáveis.
Os quintais produtivos agroecológicos, além de garantir uma alimentação saudável para as famílias envolvidas, ainda permite a geração de renda, uma vez que o excedente produzido pode ser comercializado.
No entanto, a falta de apoio institucional é evidente, com a comunidade relatando nenhum avanço por parte do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), apesar de terem solicitado assistência para demarcação de seu território. Essa alegada demora do órgão tem deixado a comunidade vulnerável às ações de desmatamentos de novos empreendimentos.
O desmatamento irregular e a extração ilegal de recursos naturais como o piçarra têm impactado negativamente o meio ambiente local, ameaçando não apenas a biodiversidade, mas também a própria subsistência da comunidade quilombola, que depende do barro para produção de artesanato, violando a produção artística e cultural das “loiceiras”.
O procurador da República Eliabe Soares, titular do ofício de Povos e Comunidades Tradicionais no MPF em Alagoas, observou que “diante desse cenário, é urgente que adotemos medidas efetivas para garantir o acesso à água potável, à proteção do território quilombola e o desenvolvimento sustentável da comunidade”. Já Érico Gomes, procurador da República que compõe o núcleo de meio ambiente no estado, destacou que “a situação de degradação ambiental é alarmante, os órgãos de fiscalização ambiental serão provocados a virem no povoado Carrasco”.
Para o enfrentamento das dificuldades que atingem a comunidade quilombola do Carrasco é fundamental a colaboração entre diferentes órgãos e organizações da sociedade civil, visando garantir os direitos humanos, sociais, culturais e ambientais desses cidadãos. O relatório que será produzido pela Equipe 10 de Comunidades Tradicionais e Patrimônio Cultural indicará as ações integradas para a promoção do desenvolvimento sustentável e a garantia dos direitos das comunidades quilombolas.
A importância da preservação das comunidades quilombolas
O território dos remanescentes de quilombo é utilizado para garantir a sua reprodução física, social, econômica e cultural, pois é nele que acontecem as relações sociais, culturais, além de ser um elemento base para a preservação da cultura afro-brasileira.
A preservação da identidade, memória e ancestralidade garante a multidiversidade do povo brasileiro, formado pelas mais diversas culturas que devem ser preservadas para que o Brasil compreenda sua própria formação e história e seja capaz de implementar políticas públicas que garantam direitos às populações invisibilizadas.
A FPI do Rio São Francisco
A Fiscalização Preventiva Integrada da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco (FPI do Rio São Francisco) iniciou a sua 13ª etapa de ações em defesa do Velho Chico e da população ribeirinha localizada no Estado de Alagoas. Seu objetivo é melhorar a qualidade ambiental da Bacia do Rio São Francisco e a qualidade de vida dos seus povos. Os trabalhos acontecem de forma contínua e permanente. Para isso, realizam-se o diagnóstico dos danos ambientais e a adoção de providências administrativas, cíveis e criminais com a indução de políticas públicas.
FPI em Alagoas
Ao todo, 28 instituições/órgãos públicos e entidades da sociedade civil organizada compõem a FPI do Rio São Francisco em Alagoas. Eles são divididos em 13 grupos conforme a finalidade da fiscalização. Trata-se das equipes 1) Extração Mineral e Resíduos Sólidos; 2) Produtos de Origem Animal; 3) Recursos Hídricos; 4) Aquática (Pesca Predatória e Segurança no Transporte Aquaviário); 5) Produtos Perigosos; 6) Fauna; 7) Centros de Saúde; 8) Flora; 9) Educação Ambiental; 10) Comunidades Tradicionais; 11) Gestão Ambiental; 12) Segurança de Barragens; e 13) Projeto Sede de Aprender.
A FPI do Rio São Francisco em Alagoas é coordenada pelo CBHSF, MPE, MPF e BPA/PMAL, que desenvolvem os trabalhos de inteligência, organização e divulgação das atividades e resultados para a população.
Participam da FPI AL: a Agência de Defesa e Inspeção Agropecuária de Alagoas (Adeal), Agência Nacional de Mineração (ANM), Agência Reguladora de Serviços Públicos do Estado de Alagoas (Arsal), Batalhão de Policiamento Ambiental da Polícia Militar do Estado de Alagoas (BPA/PMAL), Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio Francisco (CBHSF), Conselho Regional de Engenharia e Agronomia de Alagoas (Crea/AL), Conselho Regional de Medicina Veterinária de Alagoas (CRMV/AL), Conselho Regional dos Técnicos Industriais da 3ª Região (CRT-3), Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai), Fundação Cultural Palmares, Instituto Hori, Instituto do Meio Ambiente de Alagoas (IMA/AL), Instituto Para Preservação da Mata Atlântica (IPMA), Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), Marinha do Brasil, Ministério Público do Estado de Alagoas (MPE), Ministério Público Federal em Alagoas (MPF), Ministério Público do Trabalho em Alagoas (MPT), Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), Ordem dos Advogados do Brasil – Seccional Alagoas (OAB/AL), Polícia Rodoviária Federal (PRF), Secretaria do Estado do Meio Ambiente e Recursos Hídricos de Alagoas (SEMARH), Secretária de Estado da Mulher e dos Direitos Humanos (SEMUDH), Secretaria de Estado da Saúde (Sesau), Secretaria de Saúde Indígena (Sesai), SOS Caatinga, Tribunal de Contas do Estado de Alagoas (TCE/AL) e Universidade Estadual de Alagoas (Uneal).
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