FPI atua para combater trabalho análogo à escravidão em pedreiras

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Atividade econômica concentra maior número de vítimas resgatadas em Alagoas, com 72 dos 97 casos registrados desde 2020; extração de pedras também acarreta danos ao meio ambiente

Ouro Branco/AL – Somando forças na promoção do trabalho decente, a Fiscalização Preventiva Integrada (FPI) do Rio São Francisco levantou informações, nesta segunda-feira (18), sobre a cadeia produtiva da extração mineral no município de Ouro Branco. Em Alagoas, a atividade econômica que envolve pedreiras foi a que mais concentrou vítimas resgatadas de trabalho análogo à escravidão desde 2020, além de representar, por si só, uma ameaça ao meio ambiente.

O levantamento de informações relacionadas à escravidão contemporânea dialoga com o projeto “Reação em Cadeia: atuação do Ministério Público do Trabalho em cadeias produtivas”, que, em Alagoas, é tocado pela procuradora do Trabalho Marcela Dória. A iniciativa estratégica pretende identificar e responsabilizar os principais beneficiados pela exploração do trabalho em pedreiras, que não raro envolve empresas de grande porte e até mesmo o poder público, como compradores das pedras obtidas em condições de trabalho degradantes.

Crédito: Alessandro Vieira (@alessandroribeiro13)

“Nosso objetivo é promover o trabalho decente nas pedreiras. Esperamos reduzir o número de resgates de trabalho escravo na atividade e fazer com que os empregadores se sensibilizem a obedecer a legislação trabalhista nesse setor, evitando que mais trabalhadores tenham a sua dignidade violada através da exploração do trabalho escravo”, disse Marcela Dória, que integra a Coordenadoria Nacional de Erradicação do Trabalho Escravo e Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas (Conaete) do MPT.

Nessa perspectiva, a equipe Resíduos Sólidos, Extração Mineral e Segurança de Barragens da FPI visitou uma pedreira localizada dentro da Área de Proteção Ambiental (APA) da Serra da Caiçara, em Ouro Branco. Por lá, os técnicos encontraram ferramentas de extração das pedras, ambientes de descanso improvisados e estrutura elétrica para detonação de explosivos. Restos de fogueira recente e garrafa térmica com água fria foram indícios de que trabalhadores tinham passado pelo local pouco antes de a fiscalização chegar.

“Nós encontramos uma situação de exploração das pedras, como paralelepípedos e meios-fios, praticada de forma bem rudimentar. Quem trabalha no local utiliza utensílios bem rústicos, de forma manual e precária, o que causa muitos acidentes de trabalho, alguns deles fatais. A nossa atuação nas pedreiras também tem por objetivo evitar que os trabalhadores se machuquem”, disse Rafael Vanderley, coordenador da equipe Resíduos Sólidos, Extração Mineral e Segurança de Barragens da FPI.

Com o que foi apurado em Ouro Branco, o MPT abrirá um procedimento promocional para facilitar a adequação da atividade econômica, já tradicional no município, à legislação trabalhista vigente. Nele, a procuradora Marcela Dória deve envolver proprietários de pedreiras, contratantes de trabalhadores, compradores dos produtos decorrentes da extração mineral e poder público.

Desde 2020, foram resgatados 97 trabalhadores em situação análoga à escravidão em Alagoas. Dessas, 72 trabalhavam na extração de pedra, argila e areia, segundo dados do Observatório da Erradicação do Trabalho Escravo e do Tráfico de Pessoas, coordenado pelo MPT e a Organização Internacional do Trabalho.

Danos ao meio ambiente

Os técnicos da FPI também apuraram que o proprietário do imóvel não possuía licença ambiental para realização da extração mineral. A falta de autorização para a atividade econômica rendeu uma autuação e um termo circunstanciado de ocorrência, principalmente por acarretar danos ambientais dentro de uma APA.

“A extração ilegal de pedras em unidades de conservação causa sérios danos ambientais, culturais e sociais. Essa prática destrói paisagens únicas, de valor científico e histórico, além de comprometer a biodiversidade, afetar habitats frágeis e degradar o solo. Compromete também a ciência e a educação, uma vez que destrói registros geológicos e culturais importantes. Na APA da Serra da Caiçara, o impacto é ainda mais grave. A região abriga sítios arqueológicos e paleontológicos valiosos, que são diretamente ameaçados por essas atividades”, explica Anne Carolyne, agente do Instituto do Meio Ambiente de Alagoas.

A equipe de Resíduos Sólidos, Extração Mineral e Segurança de Barragens é composta por Batalhão de Polícia Ambiental (BPA), Conselho Regional de Engenharia e Agronomia de Alagoas (Crea-AL), Conselho Regional dos Técnicos Industriais da 3a Região (CRT-3), Instituto do Meio Ambiente de Alagoas (IMA/AL) e Secretaria de Estado do Meio Ambiente e dos Recursos Hídricos (Semarh).

A FPI do Rio São Francisco

A FPI tem o objetivo de melhorar a qualidade ambiental da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco e a qualidade de vida dos seus povos. Os trabalhos acontecem de modo contínuo e permanente. Para isso, realizam-se o diagnóstico dos danos ambientais e a adoção de providências administrativas, cíveis e criminais com a indução de políticas públicas.

Como programa, a FPI é estruturada em três fases: planejamento, execução e desdobramentos. A fase de desdobramento compreende o acompanhamento e monitoramento dos diagnósticos realizados e a atuação de repercussões de medidas administrativas pelos órgãos envolvidos, cíveis e/ou criminais e pelo Ministério Público competente.

Também é na fase de desdobramentos que o poder público e a sociedade civil organizada contribuem na regularização dos empreendimentos, reparação de danos detectados e efetivação das medidas de proteção necessárias.

Inicialmente realizada na Bahia, a FPI do São Francisco foi expandida para os estados de Sergipe, Alagoas, Pernambuco e Minas Gerais.

Mais informações sobre temas relacionados à FPI do Rio São Francisco serão divulgadas no perfil @fpialagoas do Instagram e no site fpisaofrancisco.inf.br.

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