Seminário “Patrimônio Cultural” será realizado na Biblioteca Municipal Leonor Magalhães Cezar, a partir das 9h, em Bom Jesus da Lapa
É a memória de um território que permite a identidade de uma comunidade transcender gerações, alimentando tradições resistentes à passagem do tempo. Com essa sensibilidade na apuração técnica, a equipe de Patrimônio Histórico e Cultural da Fiscalização Preventiva Integrada (FPI) da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco visitou prédios seculares e secretarias de Cultura nos municípios de Bom Jesus da Lapa, Carinhanha, Malhada e Riacho do Santana nesses primeiros dias de etapa.

A equipe formada por servidores do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN) e do Ministério Público do Estado da Bahia (MP-BA) atua nas frentes de conservação e preservação do patrimônio material; manifestações que compõem o patrimônio imaterial, gestão pública de políticas culturais; e educação patrimonial.
“Nosso objetivo é realizar um diagnóstico do sistema municipal de cultura, averiguando se o município cumpre com os requisitos básicos, tais como a existência de conselho, lei, fundo, plano de cultura, além de inventário, reconhecimento e salvaguarda de bens materiais e imateriais locais”, explica Diogo Vasconcellos, arquiteto e coordenador da equipe que promove a escuta de gestores públicos e da população sertaneja.
Nesta sexta-feira, todo o trabalho de campo da primeira semana será apresentado pela equipe no Seminário “Patrimônio Cultural”, na Biblioteca Municipal Leonor Magalhães Cezar, a partir das 9h, em Bom Jesus da Lapa. “Será uma oportunidade de esclarecermos dúvidas e de elaborarmos estratégias para a preservação do patrimônio cultural da região”, convida Diogo Vasconcellos, reforçando que o evento é aberto ao público.
Patrimônio material
No Município de Carinhanha, foram visitadas a Casa do Careta, a Igreja Matriz de São José e uma casa popular onde funcionava uma antiga venda na cidade. Todos os prédios são anteriores ao século XX. Já em Malhada, o registro teve como foco dois imóveis rurais.

Para análise do estado de preservação e conservação, a equipe revisita o catálogo de imóveis do Inventário de Proteção do Acervo Cultural da Bahia (IPAC-SIC). Idealizado e coordenado pelo arquiteto e pesquisador Paulo Ormíndo de Azevedo, o inventário ganhou forma entre os anos 1980 e 2000, numa iniciativa da extinta Secretaria de Indústria e Comércio do Estado.
O IPAC-SIC atribui aos imóveis do catálogo valores históricos, arquitetônicos, urbanísticos e paisagísticos. “O trabalho não só documentou os bens históricos e culturais, como também orientou a atuação de preservação nas esferas municipais, estaduais e federais”, explica a arquiteta do IPHAN Beatriz Ulloa.
Ao analisar a Igreja Matriz de São José, em Carinhanha, Ulloa observa que nenhuma das oito colunas existia no inventário dos anos 1980, compondo um grande vão com cobertura de um telhado metálico. “A realidade que encontramos foi a retomada dessas colunas e das naves laterais, que faziam parte do desenho original, e também a recomposição de um telhado cerâmico, dessa vez de uma telha plan e de um novo forro”, descreve a arquiteta.
O resgate da história dos prédios também está na narrativa contada pelos moradores locais. Durante a visita à Casa do Careta, atualmente prédio-sede da Secretaria Municipal de Cultura de Carinhanha, a equipe da FPI do Rio São Francisco encontrou a adolescente Maria Antônia, de 17 anos, aluna do 3º ano do Ensino Médio do Colégio Estadual Velho Chico. “Dois homens queriam fazer a caricatura um do outro. Eles foram pegando e montando a careta. Quando eles foram perceber, o desenho de um era exatamente igual ao desenho do outro!”, conta a estudante sobre a origem do desenho.
Patrimônio imaterial
Na primeira parte da entrevista com os gestores municipais de Bom Jesus da Lapa, Carinhanha, Malhada e Riacho do Santana, a FPI do Rio São Francisco se apresentou como programa que busca preservar o patrimônio histórico e cultural dos povos e comunidades ribeirinhos à Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco.
No que se refere à equipe em si, destacou-se o objetivo de identificar as manifestações e as práticas culturais de cada um dos municípios da região. Segundo o arquiteto do IPHAN, João Gustavo Andrade, tanto Carinhanha quanto Malhada apresentaram diversidade no seu patrimônio imaterial, principalmente na Festa de Reisado.
“No mês de janeiro, há samba de roda e o Bumba Meu Boi. Neste, há uma prática específica chamada de samba de caixa e os reis de boi, com danças típicas e populares que agregam todas as pessoas da comunidade. Outras práticas fortes são a cavalgada e os festejos juninos. Paralelamente a isso, algumas festividades de santos, como o Divino Espírito Santo e os padroeiros das cidades, trazem também essa representatividade da religiosidade local”, elencou João Gustavo.
Ao tomar conhecimento que os dois municípios possuíam comunidades quilombolas, o arquiteto orientou os gestores públicos sobre o tombamento constitucional dos quilombos como patrimônio cultural brasileiro, que é uma política pública que o IPHAN regulamentou recentemente.
“No mês de janeiro, destacam-se as festividades do Reisado, quando há diversas manifestações culturais. Dentre elas, o samba de roda e outras práticas específicas chamada de samba de caixa e os reis de boi, semelhante ao Bumba meu Boi, com danças típicas e populares que agregam todas as pessoas da comunidade.”, avaliou João Gustavo.
Gestão pública de políticas culturais
Outro objetivo das visitas às secretarias é o de ouvir os gestores, detentores culturais e a comunidade para entender o que reconhecem como bens culturais de suas cidades e quais ações e políticas públicas devem ser realizadas para sua preservação.
O historiador do MP-BA Miguel de Santana Soares abordou os sistemas municipais de cultura em suas entrevistas com os gestores. Segundo o servidor, um dos focos da equipe neste eixo é fortalecer o processo de implantação dos instrumentos de gestão na área, concretizando o Projeto Cultural Legal da instituição ministerial baiana.
“Pretendemos realizar um diagnóstico apurado sobre a efetividade desses instrumentos e da organização administrativa do município para a construção de um tipo de gestão da política pública de cultura que esteja em harmonia com os princípios constitucionais. Portanto, que dialogue com a ideia de democracia participativa, sobretudo centralizado na ideia de Conselho Municipal de Cultura. Nesse aspecto, considerando essa premissa da democracia participativa, os dois municípios estão avançando. Conseguimos perceber que eles possuem um Conselho Municipal de Cultura ativos”, relata o historiador, referindo-se a Carinhanha e Malhada.
Por outro lado, Miguel Santana afirma que existe ainda uma trajetória a ser percorrida na efetivação dos instrumentos de gestão: “Os dois municípios não possuem um plano municipal de cultura, tampouco um fundo municipal de cultura. Isso é um dado que chama a atenção, sobretudo com relação à estabilidade dessas políticas públicas. O plano municipal de cultura tem o objetivo de estabilizar a política pública, porque ele é uma lei que tem validade de 10 anos, estabelece metas, realiza um diagnóstico. Todos esses parâmetros são importantes para uma política pública continuada, que mantenha uma premissa, uma estratégia bem definida.
A FPI do Rio São Francisco
Criada em 2002, a FPI do Rio São Francisco na Bahia é um programa coordenado pelo Ministério Público da Bahia (MP-BA), pelo Conselho Regional de Engenharia e Agronomia da Bahia (CREA-BA), pelo Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco (CBHSF) e pelo Ministério Público do Trabalho (MPT).
Multidisciplinar, a iniciativa tem como objetivos: melhorar a qualidade de vidas das comunidades da bacia e dos seus recursos hídricos; combater o desmatamento, a captação irregular de água, os impactos dos agrotóxicos, a extração irregular de minérios, o comércio ilegal de animais silvestres, a pesca predatória, além de atuar no gerenciamento de resíduos sólidos. Outra frente é a da preservação do patrimônio arquitetônico, cultural e imaterial da bacia.
Inicialmente realizada na Bahia, a FPI do São Francisco foi expandida para os estados de Sergipe, Alagoas, Pernambuco e Minas Gerais. Em 2024, o programa foi o grande vencedor do Prêmio Innovare 2024 na categoria Ministério Público, a maior honraria concedida ao Sistema de Justiça brasileiro. Em 2020, a FPI do Rio São Francisco já havia sido premiado pelo Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) como o maior indutor de políticas públicas.
Composição da 51ª FPI da Bahia
Compõem a 51ª edição da FPI do Rio São Francisco na Bahia a Agência de Defesa Agropecuária da Bahia (ADAB); Agência Peixe Vivo (APV); Assessoria e Gestão em Estudos da Natureza, Desenvolvimento Humano e Agroecologia (AGENDHA); Agência Reguladora de Saneamento Básico do Estado da Bahia (AGERSA); Animallia Ong Ambiental; Agência Nacional de Mineração (ANM); Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco (CBHSF); Corpo de Bombeiros Militar (CBM-BA); Companhia de Engenharia Hídrica e de Saneamento da Bahia (CERB); Companhia Independente de Polícia de Proteção Ambiental (CIPPA); Conselho Federal dos Técnicos Industriais; Conselho Regional de Engenharia e Agronomia da Bahia (CREA-BA); Conselho Regional de Medicina Veterinária do Estado da Bahia (CRMV-BA); Conselho Regional de Química 7ª Região – Bahia (CRQ); Conselho Regional dos Técnicos Industriais da Bahia (CRT-BA); Diretoria de Vigilância Sanitária e Saúde Ambiental (DIVISA-SESAB); Fundação José Silveira (FJS); Fórum Baiano de Combate aos Impactos dos Agrotóxicos e Transgênicos e pela Agroecologia (FBCA); Fundação Nacional de Saúde (FUNASA-MS); Grupo de Defesa e Promoção Socioambiental (GERMEN); Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA); Instituto do Meio Ambiente e Recursos Hídricos (INEMA); Instituto HORI; Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN); Marinha do Brasil; Ministério da Saúde (MS); Ministério do Meio Ambiente (MMA); Ministério Público do Estado da Bahia (MP-BA); Ministério Público Federal (MPF); Ministério Público do Trabalho (MPT); Polícia Civil do Estado da Bahia (PC); Polícia Federal (PF); Polícia Militar do Estado da Bahia (PMBA); Secretaria da Agricultura, Pecuária, Irrigação, Pesca e Aquicultura (SEAGRI); Secretaria da Fazenda do Estado da Bahia (SEFAZ); Secretaria de Promoção da Igualdade Racial do Governo do Estado da Bahia (SEPROMI); Secretaria da Saúde (SESAB); Superintendência Baiana de Assistência Técnica e Extensão Rural (Bahiater/SDR); Secretaria de Infraestrutura Hídrica e Saneamento da Bahia (SIHS); Sindicato dos Técnicos Industriais de Nível Médio do Estado da Bahia (SINTEC-BA); Secretaria da Segurança Pública (SSP); Superintendência de Desenvolvimento Agrário – Secretaria de Desenvolvimento Rural (SDA-SDR); Superintendência de Proteção e Defesa Civil (SUDEC); Universidade Estadual da Bahia – Departamento dos Povos Indígenas, Comunidades Tradicionais e Camponesas (UNEB/DCT/OPARÁ); Universidade Federal da Bahia (UFBA) e Universidade Federal do Recôncavo da Bahia (UFRB).